Apresentação

Os dados do Censo Agropecuário 2006 revelaram forte concentração da produção agropecuária, que é medida pela renda bruta obtida pelo produtor, nela incluídos o autoconsumo e a indústria caseira. Constatou-se que apenas 27 mil, entre 4,4 milhões de estabelecimentos de produção rural, geraram 51,2% da renda bruta, enquanto 500 mil produziram o equivalente a 87% dessa renda. Assim, 3,9 milhões deles contribuíram somente com 13% do valor da produção, e nesse grupo 2,9 milhões geraram tão somente 3,3% da renda bruta total. Evidencia-se, portanto, uma enorme concentração da renda bruta.

A coletânea dos artigos que compõem o livro Contribuição da Embrapa para o desenvolvimento da agricultura no Brasil esmera-se em explicar as causas dessa concentração de renda. A hipótese que fundamenta os modelos econométricos e a argumentação é que a tecnologia é o principal fator a responder pelo fato de tão poucos estabelecimentos terem contribuído para a maior parte da produção colhida em 2006.

Especulou-se também o papel que os outros fatores de produção teriam exercido na produção, como área dos estabelecimentos (terra) e trabalho. Com base nos dados dos censos agropecuários de 1995–1996 e de 2006, concluiu-se que, embora a contribuição da terra tenha se mostrado estatisticamente significante nos dois censos, ela caiu de 18,1% para 9,6%, de um censo para outro. Quanto ao trabalho, constatou-se que a agricultura mecanizou-se de tal forma que a contribuição do trabalho sofreu uma redução considerável. A tecnologia assumiu o papel principal na explicação do crescimento da produção – já era muito importante em 1995–1996, quando contribuiu com 50,6% do crescimento, e se salientou ainda mais em 2006, quando explicou 68,1% do crescimento da produção.

Quando se trata da terra tão somente, é possível analisar a evolução da área colhida, da produtividade da terra e da produção. Estudos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento mostram ser a produtividade da terra – portanto, novamente a tecnologia – dominante na explicação do crescimento da produção.

Neste trabalho, a desigualdade da renda bruta foi medida pelo índice de Gini. Se todos os estabelecimentos tivessem apresentado a mesma renda bruta, esse índice valeria zero. Se um deles tivesse se apropriado de toda a renda bruta, o índice de Gini valeria 1. Assim, quanto mais próximo de 1 for o índice de Gini, maior será a desigualdade da renda bruta. Mediu-se o índice de Gini para o grupo de estabelecimentos de 100 ha ou menos, e para os de mais de 100 ha, e praticamente não se observou diferença. Respectivamente, o índice de Gini igualou-se a 0,85 e a 0,87. A desigualdade é, assim, a mesma nas duas classes, e muito alta, o que sugere, mais uma vez, ser a tecnologia a responsável principal pela desigualdade da renda bruta.

A tecnologia foi o principal motor a impulsionar o agronegócio. Ela teve papel preponderante na administração da dívida externa e na acumulação de um montante expressivo de reservas. Contribuiu, ademais, para o abastecimento do mercado interno e impulsionou as exportações.

Outra importante vantagem conferida pela tecnologia foi a grande redução do custo da cesta básica, cujo maior beneficiário foram os mais pobres, que gastam a maior parte do salário na compra de alimentos. Com efeito, no período de fevereiro de 1976 a julho de 2012, o custo da cesta básica teve uma queda anual de 2,18%, tendo acumulado no período a impressionante redução de 79,42%. Essa redução garantiu o sucesso dos programas de transferência de renda para os mais pobres, os quais se fundamentaram na aquisição de alimentos. No fundo, a modernização da agricultura significou importante redistribuição de renda.

O que teve a Embrapa a ver com tudo isso? A produtividade da agricultura não cresce sem tecnologia. É reconhecido o esforço da Embrapa, dos institutos de pesquisa e das universidades para isso. A contribuição da Embrapa foi estimada via fronteira estocástica de produção. Estimou-se a eficiência técnica e sua associação com as ações da Embrapa, a qual se mostrou significante estatisticamente.

Em outros artigos da coletânea de artigos, foram analisados alguns problemas relativos a cultivares e à participação de empresas especializadas no mercado, além de detectar implicações de leis recentes para o desenvolvimento da pesquisa pública.

A tecnologia explica o sucesso do agronegócio, tanto para o produtor quanto para a agroindústria, os transportes, as exportações e os arranjos para financiar a safra, com grande participação da iniciativa particular, brasileira e estrangeira. Tudo isso são sinais da dinâmica da difusão de conhecimento na sociedade brasileira. Ou seja, depois de criados os conhecimentos, sua difusão explica o sucesso da modernização da agricultura. Nesse sentido, a difusão de conhecimentos na agricultura brasileira tem sido muito bem-sucedida. O sucesso aplica-se, porém, a 500 mil estabelecimentos, de um total de 4,4 milhões.

Faz-se mister o entendimento do que não funcionou propriamente com os 3,9 milhões de estabelecimentos restantes. A grande maioria deles concentra-se no Nordeste e ficou à margem do progresso. A difusão de conhecimentos não ocorreu para esta população. A Embrapa está firmemente empenhada em ajudar a encontrar a solução e a propor ação, e o faz sob a liderança do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da Presidência da República.

Este trabalho apresenta a dinâmica da agricultura brasileira e suas lacunas. Faz isso com evidências e ferramentas modernas de análise – tanto estatísticas quanto econométricas e de raciocínio lógico – e a análise tem como suporte os princípios do método científico.

Maurício Antônio Lopes

Presidente da Embrapa